segunda-feira, 21 de junho de 2010

Oito – Admiração

- Eu não agüento mais. Aquela garota vai me deixar louca em pouco tempo, Su!

Aquela era Lúcia, umas das poucas melhores amigas Sueli. Era uma mulher magra, de cabelos escuros e lisos, rosto magro e começando a apresentar os primeiros sinais da idade. Na verdade ela era mais nova do que parecia, umas décadas de vício em nicotina acabaram com sua juventude. Mas ela também não parecia esquentar muito para isso. A filha adolescente e o marido preguiçoso tinha prioridade na sua lista de preocupações diárias. Ela trabalhava no escritório ao lado de Sueli, num consultório odontológico. As duas se conheceram encontrando nos corredores durante o expediente e dividindo elevadores. Os cumprimentos educados do dia-a-dia se transformaram em conversas, que evoluiu para uma confiança mútua e, assim, amizade.

- Você acredita que outro dia, eu cheguei em casa, e passando no quarto dela, e vi uma camisinha usada em baixo da cama dela?

As duas tinham feito uma pausa estratégica no meio da manhã para tomar um café básico. Sueli queria apenas o café, as o vício em nicotina de Lúcia também era acompanhado da cafeína.

Ela desceram a rua até uma galeria – coisa comum em juiz de fora – e pararam na habitual lanchonete, que ficava embaixo da escada para o segundo andar da galeria, quase que escondido.

- Qual o problema? – Sueli perguntou, procurando a carteira na bolsa de couro preto.

- “Qual o problema”? A Bia é muito nova pra fazer sexo! E o pior: na minha casa!

- Quanto anos a Bianca tem? 16, 17? Você não sabe como eu ficaria feliz de encontrar uma camisinha usada no quarto do Alex quando ele tinha essa idade. Quando ela aparecer dizendo que acha que está grávida, você vai entender o que eu estou falando. Me vê um café, por favor. – Sueli disse.

- Um pra mim também. Eu não ligo para a camisinha. Eu ligo para o sexo, Su! Sem contar que foi nojento!

Contra aquilo, Sueli não podia argumentar.

- Lúcia. Gostando ou não, sua filha já tem uma vida sexual ativa. E já que é assim, melhor que seja prevenida!

- Eu sei! Mas ela é minha menininha!

- Nossos filhos sempre são nossos menininhos, bebezinhos e todos os “inhos” mai que se pode imaginar... mas eles crescem.

- Não deveriam.

- Eu concordo, mas não fomos nós que fizemos as regras.

Sueli mal terminou a frase e o celular da amiga começou a apitar.

- Su, já volto – e Lúcia se afastou, colocando o aparelho na orelha.

Sueli tomou um gole do seu café quente, sentindo-o revigorá-la por dentro. Estava distraída olhando para a vitrine do outro lado da lanchonete, admirando um vestido., quando alguém a chamu.

- Com licença – ela olhou rapidamente – Você é a Doutora Sueli Moreira?

Era um garoto. Não bem um garoto, mas comparado a ela, sim, com toda certeza. Devia ser alguns anos mais velho que Alex, tinha cabelos escuros e enrolados, cortados estilo asa-delta, olhos negro e brilhantes. Seu rosto era quadrado com maxilar robusto, coberto por uma barba muito bem aparada. Embora estivesse sentado no balcão, Sueli sabia que ele era bem alto. Vestia-se com elegância, camisa social e calça impecáveis, sapatos lustrosos e um relógio caro no pulso. Sueli já estava no ramo a tempo suficiente para saber: ele era um advogado.

- Sim, sou – ela respondeu, desconcertada e surpresa.

- Desculpa. Eu sou Pablo – ele disse estendendo a mão grande e robusta – Eu assisti algumas audiências suas quando fazia estágio no fórum.

- Quem não já viu? – ela riu, ainda mais sem graça.

- Não! Estou falando sério. Eu admirava o jeito como você montava e defendia seus casos. Principalmente os de guarda de menor. Eu acho impressionante sua dedicação.

Sueli prestou muita atenção em Pablo. Havia uma certa suspeita sobre ele, algo no olhar, no sorriso. Sua admiração era genuína, mas tinha algo mais.

- Obrigada. Mas fica muito fácil conseguir determinação quando o outro responsável é um irresponsável – Sueli disse, contraindo mais seu sorriso, sentido-se desconfortável com aquela abordagem.

- Posso lhe pagar um café?

Sueli levantou sua xícara, como quem diz: “olha ele aqui”.

- Ok – Pablo sorriu, sem graça – Posso pagar esse, então?

- Não precisa. Obrigada.

Nesse instante, Lúcia retornou, guardando seu celular na bolsa.

- Aqui, vamos. Tenho que correr, agora!

- O quê? Você nem tomou o seu café! – Sueli protestou.

- Tem problema, não! Paga aí e depois eu te devolvo o dinheiro – Lúcia parecia ansiosa pra ir embora.

- O que houve? – Sueli perguntou.

- Nada! Olha só! Olá, garotão! – ela disse, olhando para o outro lado do balcão, onde Pablo estava. Lúcia foi até lá e com um sorriso meio tímido, perguntou: - Você tem um cartão ou algo assim? É que minha amiga já não paquera faz muito tempo, ela não entende mais alguns sinais básicos...

- Lúcia! – Sueli protestou horrorizada.

- Mas se você me der um cartão ou um telefone, eu tenho certeza que ela vai entender.

Pablo abriu um sorriso enorme, visivelmente se divertindo com a desenvoltura – leia-se: cara de pau – de Lúcia e o embaraço de Sueli – que parecia querer enfiar a cabeça num buraco e nunca mais tirar.

- Eu não acredito que faça tanto tempo assim – ele disse a Lúcia – Tenho certeza de que onde ela vai, todo mundo a observa.

Lúcia virou para a amiga.

- Está vendo que homem galante.

- Ok, pega o cartão e vamos embora! – Sueli disse, exasperada.

- Aqui – Pablo tirou um cartão de visitas do bolso da camisa e entregou à Lúcia.

- Obrigada, Pablo – ela disse, lendo o texto do cartão.

Sueli pegou a amiga pelo braço, sorriu completamente desconcertada para Pablo e arrastou pelo caminho de volta.

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