domingo, 11 de julho de 2010

Vinte - Suporte

Rafael conseguiu se acalmar um pouco e se desvencilhou do abraço da amiga, se sentindo muito mais estável, agora.

- Você já ficou com algum garoto?

- O quê?! - espantou-se. - Não!

- Não ficou por que não teve oportunidade ou por que ficou com medo?

- Os dois! O que aconteceu com o “não queria invadir seu espaço”???

Ela sorriu mais uma vez:

- Agora que você me contou, fiquei curiosa, só isso! E ver um garoto, digamos, ao natural?

O conforto que ele conseguiu estava se esvaindo. Seu rosto corava a medida que ficava mais encabulado.

- Bem, eu vi os meninos, no vestiário, depois das aulas de educação física.

Ela gargalhou.

- Faço uma idéia de como você fica! Eles são bem gostosinhos!

- Para com isso! Não tem graça!

- Tem sim!

Rafael não riu.

- Desculpa. Mas você nunca provocou nenhuma oportunidade de ficar a sós com um cara?

- Não!

- Nem pela Internet?

- Não! Não tenho coragem de conhecer ninguém pela Internet! Como vou conhecer alguém que está em outro lugar da cidade que eu nunca vi na vida?

- Não dá pra ser paranóico desse jeito, né, Rafa. Tem que ser cuidadoso, é claro, mas nem todo mundo que quer conhecer alguém pela net é o bicho papão! Tem milhares de outros garotos na sua situação: morrem de vontade de experimentar ficar com outro carinha, e a net ajuda.

- Não faz meu estilo. Além do que, no momento só uma pessoa importa. Ou importava...

Ana sentiu que o assuntou ficou pesado.

- O que você vai fazer agora?

- Bem, não posso fazer muita coisa a não ser aceitar, não é mesmo?

- Vá a luta!

- Ficou maluca de vez?! - gritou - Não sei se você percebeu, mas o Selton é hétero! E bem hétero, pra ser sincero! Ele pegou a Débora!

- Aquilo foi uma ficada! Só isso! Até você já ficou por ficar!

- Alô! Ainda não deu pra notar o principal: ele é heterossexual! Gosta de garotas, curvas, seios e pele lisa! E eu não tenho nada disso!

- Você nunca investiu, nunca perguntou, nunca agiu! Como pode afirmar isso?

Rafael começou a ficar irritado:

- Você não viu a cena na piscina?! Viu aquele beijo?

- Vi! Mas isso não quer dizer nada, Rafa!

- Deus! E se significasse, eles já estariam casados!

Ana despiu-se da roupa de amiga animadora e admitiu:

- Você tem razão.

- Ó único jeito é aceitar e agüentar o que vier pela frente.

- Ah! Não acho que os dois vão começar um relacionamento estável. Ela não faz esse tipo.

- Nem ele - disse se lembrando da primeira conversa que tiveram - Mas sou amigo dele, vou ter que agüentar seus comentários da ficada, do que gostou, do que não gostou, de como é o beijo dela...

- Eu vou te avisar o óbvio, mas ele é um garoto. Conversas desse tipo, só as meninas têm!

- Quem me dera! Ele vai falar que ela é muito gostosa, que beija muito bem, que fez e aconteceu!

- Ele não faz esse tipo, não é de contar vantagem! Talvez ele faça um ou outro comentário, mas não vai se prolongar muito nisso. Foi apenas uma ficada!

- E se não for?

Ela parou e pensou. Não achou resposta alguma.

- Eu sinto muito, mas vou estar sempre do seu lado.

Rafael suspirou.

- Não quero voltar pra festa. Queria ir embora, queria desaparecer.

- Se você se trancar aqui em cima, o pessoal vai desconfiar de alguma coisa e os comentários maldosos podem aparecer.

- Não tenho mais vontade de participar da festa!

Foi a vez de Ana suspirar, procurando paciência.

- Então vou ficar aqui em cima com você.

- Não! Vá curtir a festa! Você não tem nada a ver com meus problemas!

- Sim, eu tenho! Você é meu amigo! E se eu ficar aqui, espantamos qualquer chance de alguém começar um comentário maldoso sobre você ter ficado com ciúmes do Selton!

- Não entendi...

- Eu e você sumimos da festa de repente! O que acha que o pessoal vai falar?

- Que viemos aqui pra cima para ficarmos! Você não se importa?

- De falarem que fiquei com você? Se fosse me importar já estaria maluca! E podemos colocar os assuntos em dia.

- Você não existe.

- Obrigada.


Dezenove - Similares

- Quer saber, você tinha razão – Sueli disse, ao terminar de engolir uma garfada de uma saborosa salada de alface, beterraba e cenoura raladas com algumas todas de azeite e limão – Eu não conhecia esse restaurante.

Pablo sorriu satisfeito. Era mais uma satisfação maliciosa.

- Eu disse.

O restaurante ficava no centro da cidade, onde antes funcionava uma loja celulares. Era uma imóvel grande, de teto alto, agora cheio de cadeiras e mesas de bambu, trançado com palha de milho, os donos preferiram fazer uma decoração mais rústica no ambiente, combinando com meia-luzes amarelas e quadros de paisagens. Era um ambiente bem agradável, bem espaçoso e arejado. Uma longa bancada deixava a mostra os pratos vegetarianos mais variados, todos coloridos de verde, vermelho, roxo, laranja... Embora restaurantes vegetarianos não fizessem tanto sucesso em Juiz de Fora, aquele parecia estranhamente vazio.

- Como você ficou sabendo dele?

- Os sócios dos restaurantes são meus amigos. Abriram essa semana.

- Sério? Isso explica muita coisa.

- Gostou do lugar? Da Comida?

- Sim. Deliciosa. Cumprimentos ao chefe.

- Éh! O restaurante é bom mas ainda não chega a ser um francês.

- Só porque a sofisticação não chega a esses padrões internacionais, não quer dizer que o chefe não queira seu trabalho reconhecido. Um ótimo trabalho aliás.

Pablo sorriu.

- Vou pedir aos meus amigos que transmitam os elogios.

- Obrigada.

Pablo estava, ao contrário dos outros dias, vestido seguindo um estilo mais casual. Camisa de malha de marca de um verde água bem claro, calça jeans e tênis da Adidas. O habitual relógio no pulso esquerdo e uma fina corrente de prata no direito. Naquele dia, ele parecia ainda mais novo, o que Sueli não decidir se era bom ou ruim. Durante a semana, Pablo tinha aquela aparência de homem maduro, graças às roupas sociais que usava para trabalhar, mas ali diante dele estava um outro Pablo, alguém mais espontâneo, mais leve, mais jovem mesmo. Claro que ela gostava daquela versão mais jovial do novo amigo, mas por alguma razão, preferia o Pablo advogado de dia de semana. Talvez porque não se lembrava tanto que o amigo tinha quase a mesma idade do filho mais velho.

Mas mesmo mais casual, Pablo não deixou de ser o homem inteligente que ela conhecera dias atrás. Ainda tinha propriedade ao falar, ao discutir com Sueli, ao olhá-la, não tinha surgido nenhuma infantilidade ou idiotice juvenil de sua boca. Mesmo dirigindo, ele foi extremamente responsável – levando em conta que homens não têm certos modos e não são atentos a certas regras ao volante.

A dúvida que pairava na cabeça de Sueli era: estaria Pablo fingindo ser maduro e responsável apenas para impressioná-la. Afinal, ela já chegava aos seus quarenta e garotões marombados - que só pensam em musculação, luta livre e cervejadas – não eram nem de longe atrativos. E isso estava estampando em tudo nela; Sueli admirava inteligente, não beleza. Portanto, se Pablo estivesse tentando conquistá-la, nada mais lógico do se mostrar maduro e inteligente. Não que fosse conseguir alguma coisa, mas seria o passo mais lógico a ser dado.

Outra coisa que deixara Sueli com a pulga atrás da orelha era a visível marca pálida de aliança no dedo anelar esquerdo. A ausência da jóia a deixou intrigada, mas nunca perguntou se Pablo era casado porque, até o momento, não sentia que estava fazendo nada de errado – como ser a amante de um garotão doze anos mais novo, por exemplo. Agora, mesmo que não se interessasse afetivamente por ele, não podia deixar de perguntar:

- Onde está a sua esposa? – levemente constrangida.

Pablo se espantou.

- Que esposa?!

- A marca da aliança no seu dedo – ela disse, quase se lamentando, pensando na pobre mulher que esperava o marido em casa para almoçar com ela.

- Ah! – ele percebeu – Pois é...

- Deixou o anel onde? No carro?

- Não... No joalheiro. Mandei derreter.

- “Derreter”?

- Éh! – afirmou – Derreter. Não sabia o que fazer com elas depois que minha noiva terminou comigo. Aí, mandei derreter, fazer outra jóia, vender... pra falar a verdade ainda não sei o que fazer. Só precisava me desfazer dos anéis.

Sueli ficou alguns momentos tentando absorver o que Pablo havia dito. Mas era muito difícil.

- Me desculpe por...

- Assumir que estava procurando um caso extraconjugal? Não se preocupe Sueli, eu pensaria a mesma coisa.

- Eu vi a sombra da aliança e achei que você tinha escondido em algum lugar.

- É recente, tem só alguns meses que terminamos o noivado – Pablo explicou, mas era evidente que tocar naquele assunto não era fácil - E como não tenho tido muito tempo pra tomar sol... essa coisa ficou aqui.

Então Sueli se lembrou da própria marca no dedo. Depois que seu marido morrera, ela ainda usou a aliança de casamento por anos, sem ter coragem de tirá-la. Para evitar que as pessoas perguntassem muito, acabou usando outro anel no mesmo dedo, para camuflá-lo, mas tirar mesmo, só depois de muito tempo, e ainda fora muito difícil parar de usá-lo, não pela jóia em si, mas por causa da história que tinha vivido com o marido.

- Entendo o que quer dizer.

- Acho que foi melhor terminar tudo antes do casamento.

- “Antes tarde do que nunca”?

- Você lida com processos de separação e divorcio todos os dias. Sabe como essas coisas são complicadas e desgastantes.

- É uma boa maneira de tentar ver as coisas.

- Com toda certeza. E eu não tenho muita vocação pra ficar lamentando pelos cantos. Fiquei muito abatido quando decidimos terminar o noivado, mas não vou ficar chorando o resto da vida por isso.

- Algumas pessoas chamariam isso de frieza.

- Você é uma delas?

Sueli quase engasgou.

- Não sei. Eu vivi uma grande história com um homem maravilhoso. Não sei descartar amores como se não tivessem significado nada.

- A minha história significou muito. Pelo menos pra mim.

Sueli achou o primeiro ponto de tensão entre eles. Se ela insistisse mais naquele assunto, acabariam discutindo e essa era a última coisa que ela queria. Afinal de contas, não tinha nada a ver com a vida de Pablo.

Dezoito - Contando a Verdade

- Rafael! - Ana bateu à porta.

Rafael fingiu que não estava ali.

Do outro lado, ela girou a maçaneta e, ao perceber que ela estava trancada, balançou-a com mais vigor. Em vão.

- Rafael! Abra essa porta, quero falar com você!

O garoto continuou calado.

- Eu vi o que aconteceu lá embaixo, Rafael! - ela fez uma breve pausa, como se ainda estivesse decidindo se devia continuar ou não - Eu sei que não é fácil.

Do que Ana estava falando? O que não era fácil? Certamente, ela tinha visto o ciúmes dele, mas tinha interpretado da forma errada.

- Eu sei que você está aí! Eu te vi subindo, depois que o Selton ficou com a Débora. Deixe-me cumprir o meu papel de amiga e conversar com você!

Tudo que ela obteve como resposta foi silêncio.

- Rafael, eu sei que você gosta do Selton.

- O QUÊ?! - ele gritou.

- Me deixe entrar e poderemos conversar melhor. Do lado de fora, pode parecer que estou conversando com a porta.

Finalmente, Rafael se convenceu. Foi até a porta, destrancou-a e a abriu.

- Eu não sei do que você está falando - disse ele, através da porta entreaberta.

Ela o olhou com uma expressão engraçada:

- Isso significa que você sabe, sim!

Rafael permaneceu estático. Estava dividido, não sabia se queria conversar naquele momento ou se queria a companhia de sua amiga.

- Eu disse que daqui de fora parecia que eu estava conversando com a porta, mas o que você fez, não muda muito a minha situação. Vamos conversar melhor do lado de dentro. Eu acho...

Rafael, não demonstrou nenhum ânimo, mas saiu do caminho e, assim que passou, Ana trancou a porta.

- Obrigada.

Rafael sentou-se no beliche, de frente pra ela.

- Não fique desse jeito.

- Tem como não ficar?

Ana veio e se sentou no outro beliche, ficou cara a cara com Rafael.

- Eu sei que é difícil.

- Quando você percebeu... que eu gosto do... Selton?

Ela sorriu, simpaticamente:

- Na verdade, eu sei que você gosta de garotos há bastante tempo. Acho que desde o ano passado.

- Como você percebeu?

- Eu fui percebendo, na verdade. Via que você olhava demais para os meninos e de menos para as meninas; sempre que alguém puxava algum assunto de garotas você dava um jeito de se esquivar; o Guilherme sempre falando sobre você ser gay e você sempre na defensiva. Acho que foram vários sinais.

- Quer dizer que eu já dei pinta?

- Um pouco - admitiu a garota. - Não dá pra reparar, se olhar uma vez ou outra, só se manter uma observação constante. E, realmente, ninguém tem tempo pra prestar atenção em uma pessoa. Só as amigas malucas.

Ele conseguiu sorrir um pouco.

- E por que nunca me falou que sabia?

- O que você ia dizer?

- Ia dizer que não.

- Então! Preferi esperar você vir até mim e contar, não queria invadir seu espaço. Só que isso nunca aconteceu.

Rafael hesitou por um momento, abaixando a cabeça.

- E você não me acha... estranho?

- Estranho?! Como assim?

- Sei lá! Estranho, errado, nojento, uma aberração?

- Lógico que não! - revoltou-se - Sempre achei você uma pessoa maravilhosa, um amigo perfeito! Um pouco teimoso às vezes. Minha opinião não mudou, quando descobri. Só fiquei um pouco chateada por você não me contar, mas não podia te obrigar a me contar! Agora, te achar uma “aberração” por ser gay? Nunca!

Ele ficou envergonhado. Ana estava absolutamente correta. Devia ter confiado na amiga, na amizade que tinham há muitos anos.

- Me desculpe.

Ela se levantou e se sentou ao lado do amigo.

- Não tem do que se desculpar. Sei que não é fácil aceitar uma coisa dessas. Eu observei você esse tempo todo e vi que ainda não se aceitou como gay, até porque você temeu que eu fosse te julgar. Deve ser assustador, mas, acredito, que não haja outra forma. E não é ruim ser gay! Só é um outro jeito de gostar de alguém.

Rafael sentiu o choro brotar mais uma vez. Ninguém nunca tinha falado com tanta doçura quanto Ana, naquele momento. Ela estava lhe mostrando um outro lado de sua situação, que por medo ou por ignorância nunca tinha se permitido ver.

- Eu tenho medo. De assumir e...

A garota o interrompeu:

- Soltar a franga? Ah! Pelo amor de Deus, né, Rafa! Não é só por que você gosta de um cara que você vai agir como mulher! - ela se acalmou da explosão repentina. - Lembra de um dos meus tios, o que não é casado?

- Acho que sim! Você já me falou sobre ele.

- Ele não é casado porque é gay. Só que ninguém sabe, além da minha família. Ninguém desconfia. Uma vez ouvi, ele comentar que numa festa do trabalho dele, a mulherada caiu em cima dele. Não sei como ele é entre quatro paredes, mas ele age normalmente, como homem.

Rafael ficou pensando e, de repente, se sentiu meio idiota por ter, um dia, ter achado que iria ficar afeminado.

- Rafa, se você fosse rebolar por aí, já teria começado há muito tempo. Você tem todo jeito de homem, fala como homem, se comporta como homem. Tem caráter de homem! E isso é mais importante que tudo!

Rafael não conseguiu se conter e chorou, abraçando a amiga, que retribuiu a altura. Apertou bem forte entre os braços e o deixou chorar o quanto precisasse.

- Não se preocupe. Eu estou aqui com você.

Dezessete - Preocupação Genuína

Ana ouviu a gritaria na piscina e foi ver o que estava acontecendo. Quando colocou os olhos na cena, a única coisa que passou pela sua cabeça foi: “Ela conseguiu”. Não que fosse alguma surpresa. Débora era o tipo de pessoa que conseguia o que queria, ou, no caso, quem ela queria. Selton até demorou pra cair na rede dela, geralmente os garotos não esperavam muito, e nem ela. Sua persistência só era vencida pela rapidez com que se entediava. Sorte Selton não estar procurando algo sério, ou as coisas poderiam acabar mal.

Por outro lado, talvez elas já estivessem dando errado. Deixou o prato que arrumaria para almoçar na mesa da cozinha – entulhada de coisas – e foi para a sala. Dentro da casa mesmo, não havia quase ninguém – ou quase nada, exceto as dezenas de mochilas. A única pessoa que Ana viu foi Guilherme, que estava no pé da escada, olhando para cima indeciso, como se não soubesse se subia ou não.

- O que houve? – Ana perguntou.

- O Rafael subiu aqui, que nem um maluco! – Guilherme respondeu – Eu pensei em subir e perguntar se ele está bem, se bebeu demais... mas, você sabe... ele me detesta.

- Você está mesmo preocupado com o Rafael? – Ana perguntou, estranhando o brilho peculiar no olhar de Guilherme. Claro que ele se fingia de bonzinho quando estava perto dela, mas não havia fingimento desta vez. Não que ela pudesse detectar.

- Estou. Às vezes ele bebeu demais, comeu alguma coisa que não devia. Sei lá!

- Talvez haja esperança pra você, afinal de contas... – ela comentou, vagamente – Não foi a bebida. Pode deixar que eu vou ver o que há com ele.

Guilherme nem respondeu, mesmo seus neurônios avantajados ficaram sobrecarregados analisando o que Ana acabara de falar.

- O que você quer dizer com isso? – ele perguntou. Mas era tarde. Ana já tinha subido pra cuidar de Rafael.

Dezesseis - Indo À Baixo

Era como descer uma montanha-russa sem fim. O estômago congelou no ato! Tudo ficou silencioso, tudo perdeu o sentido. Suas pernas fraquejaram e por pouco não desmoronou, seus braços formigaram, seu rosto se contraiu todo. Aliás, seu corpo todo se contraiu.

O beijo era lindo, típica cena de filme. Os dois na piscina, o reflexo do sol na água ondulando sobre suas peles, o cabelo de Débora todo colado ao corpo, as bocas pareciam que iam se engolir mutuamente.

Todo mundo gritava incentivando, afinal, ele era novato e já tinha se dado bem com uma das garotas mais bonitos do colégio! Todos menos Rafael. Ele não conseguia dizer nada, não conseguia pensar em nada a não ser em Selton, ficando ali, na frente dele. O cara por quem ele era fissurado, beijando uma garota bem na sua frente. Sentiu seu coração apertar dentro do peito.

Rafael recobrou alguma reação. Só podia pensar em sair dali o quanto antes. Deixar aquela cena para trás, esquecer que a viu. Sem se dar conta, subiu em direção à casa, passando por vários colegas que sequer prestaram atenção nele. A única pessoa que o parou foi Guilherme que trombou nele na porta da sala. Foi tão repentino que Guilherme não teve nem tempo de fazer sua cara sarcástica.

- O que houve, Rafael? – ele perguntou, genuinamente preocupado.

- Agora não, Guilherme! – Rafael gritou, empurrando-o.

Ele simplesmente subiu para o segundo andar da casa, onde sabia que não havia ninguém. Entrou primeiro quarto que encontrou e fechou a porta.

Naquele quarto, não havia tanto barulho. A música alta fazia a parede pulsar e as vozes dos amigos podia ser ouvida, eram apenas um burburinho distante. Felizmente, os dois beliches e a cômoda faziam o som ficar abafado.

Sentiu-se frio, por dentro, vazio. Encarar o que viu na piscina era pavoroso, dava medo. Já tinha sentido aquilo antes, por garotas que havia se apaixonado, mas não as conquistara e ficara “chupando dedo”. Agora era muito mais intenso, o sentimento de derrota era mais esmagador. Sentiu o choro apertando a garganta e inundando os olhos. Uma parte dele queria culpar Selton. “Por que ele fez isso?”, mas compreendeu em um instante que não tinha motivos para culpá-lo, Selton não devia nada a ele, a não ser a amizade. E Rafael sabia que aquilo podia acontecer. Na verdade, não era nem uma questão de possibilidade, era questão de quando aconteceria. E não haveria ocasião mais

Nada o faria aceitar aquela cena. A tristeza era imensa. Compreender que Selton não devia nada a ele, não significava absolutamente nada para o seu coração! Mais do que nunca estava sozinho.