terça-feira, 22 de junho de 2010

Treze – Chuteiras

Selton revirou tudo! Sapateiro, gaveta de meias, debaixo da cama, no cesto de roupa suja, máquina de lavar... Mas não achou seu par de chuteiras em lugar nenhum. E já estava se atrasando. Sua mochila já estava pronta: toalha, sabonete, calção e uma antiga camisa do São Paulo. Só faltavam mesmo as chuteiras, que ele não encontrara em lugar nenhum.

- Brow! – Selton gritou, enquanto subia as escadas correndo – Você viu minhas chuteiras?

Ninguém respondeu.

Selton correu na porta do quarto do irmão e abriu com tudo. Selton teve a sensação de que do jeito que as caixas de mudança chegaram, elas ficaram. Elas se empilhavam pelos cantos, cobertas por algumas roupas usadas. O quarto era uma verdadeira confusão.

Júnior estava deitado em sua cama, com o fone no ouvido, ouvindo músicas no MP4 surrado.

- Fala, Brow! – ele disse.

- Você viu minhas chuteiras?

Júnior pensou um pouco.

- Já olhou nas coisas do Hugão. Devem estar por lá! Dona Mônica deve ter confundindo com as dele na hora empacotar tudo.

- Valeu.

- Vai onde, Brow? – Júnior perguntou antes que o irmão sumisse.

- Tenho um jogo hoje, com a galera do colégio.

- Você é rápido...

- Não tanto quanto eu gostaria. Já estou me atrasando.

Selton correu no quarto dos pais, um cômodo enorme, com uma cama king size coberta com lençóis de algodão egípcio e travesseiros de pena de ganso, de cada lado da cama, havia uma mesinha de cabeceira, cada uma com um abajur. Do lado esquerdo, tinha um copo de água vazio, dois livros de administração de empresas e um par de óculos; do direito, o Código da Vinci, de Dan Brown e um despertador. O quarto não tinha janelas, mas, sim, uma grande porta deslizante que saía pra varanda. Na outra parede havia um enorme guarda-roupas embutido, tabaco e branco, que os pais dividiam. Selton abriu uma porta e se deparou com a coleção de vestidos e roupas de grife da mãe.

- Ops. Porta errada.

Abriu a porta do outro canto e achou os ternos e camisas sociais do pai, algumas camisas esporte e bermudas. Fez correr as gavetas dos sapateiros e entres os sapatos de couro e tênis de marca, lá estava sua chuteira. Pegou-a, olhando o relógio.

- Droga.

Correu para seu próprio quarto e pegou a mochila que estava em cima da cama.

- Falou Brow! – gritou, descendo as escadas às pressas.

Quando chegou a porta de entrada, quase quebrou o nariz, pois alguém estava entrando.

- Ei! – gritou Mônica, assustada com o filho prostrado trás da porta – Selton, onde você vai com essa pressa toda?

- Jogo! – ele respondeu.

- Jogo? Que jogo?

- Com a galera do colégio, mãe! Eu já estou atrasado.

Foi como se não tivesse dito nada:

- A gente não está aqui nem há uma semana e você já se enturmou?! – ela se espantou com a facilidade do filho para fazer amigos.

Selton riu, todo convencido.

- Fazer o que, né, Dona Mônica?

- Ainda bem que seu irmão não tem o seu carisma. Fico com medo só de pensar na quantidade de – ela lamentou-se, fazendo cara débil, ao se lembrar de porque tinha se mudado para aquela cidadezinha...

- Não fala assim, Dona Mônica... – Selton advertiu.

– Por falar nisso, ele ainda está aí? – perguntou, de má vontade.

- Lá em cima, no quarto dele.

- Aquela confusão, você quer dizer...

Selton conseguiu contornar a mãe e chegar a porta.

- Pega leve com ele, Dona Mônica – e já ia fechando-a.

- Onde você pensa que vai sem me dizer “tchau”?

Selton fez uma cara enfadonha e voltou, correndo. Deu um beijo na mãe e disse, antes de fechar a porta:

- Tchau, Dona Mônica. Comporte-se.

- Juízo, Selton!

- Eu tenho! – ele gritou do lado de fora.

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