quarta-feira, 28 de julho de 2010

Seis - Amanhecer

Seis - Amanhecer

A tempestade avançara pela noite, sem trégua, sem descanso, Naquela madrugara chovera mais do que o previsto para o mês todo. Mas a medida que as horas passaram, ela diminuiu de intensidade, até que se tornou uma leve garoa e, por fim, cessou completamente. Quando a manhã nasceu, as nuvens cinza e maciças que cobriram o céu se tornaram nada mais do que nesgas escuras e compridas contra a palidez azul da alvorada, o vento frio de bonança corrias por entre árvores, prédios e postes. O asfalto e o cimento ainda estavam molhados, cobertos de largas poças nas imperfeições do chão.

Rafael despertou com a luz ofuscante do sol entrando por sua janela. Tinha deitado-se na noite anterior tão distraído que se esquecera de fechar a cortina. Sentiu-se feliz, totalmente feliz, o corpo relaxado e calmo. Dormiu como um anjo, teve sonhos maravilhosos.

Espera? Foi só um sonho? Lembrou-se de ter tido uma noite maravilhosa com Selton, te depois de ter chegado em casa do churrasco, se afundou na sua cama, chorou tudo o que podia; então, Selton apareceu para saber o que havia de errado. Acabou se declarando e ficaram. Depois, Selton o pediu em namoro e tomaram banho juntos. Foi um sonho maravilhoso.

Virou-se para o lado para se espreguiçar e acabou esbarrando em alguém.

Não foi um sonho. Selton estava ali, do seu lado, acordado.

- Bom dia, meu namorado - ele disse, docemente.

- Bom dia - respondeu Rafael, dando-lhe, em seguida, um beijo - Não estou a fim de sair daqui. É tão bom ficar do seu lado.

- Melhor, não. Se ficarmos aqui vamos acabar fazendo barulho - disse apontando com o olhar, para baixo, onde seu volume já dava sinais de vida. Então percebeu que ele mesmo estava excitado.

- Ah! Se a gente fizer baixinho, que problema tem?

- Você está me saindo um belo assanhado...

- “Belo”?

- Lindo!

- Fala de novo! – Rafael pediu.

- Lindo!

- Vamos descer, tomar um café, que já deve ter gente em casa.

- Eh! Eu acho que seu irmão já chegou.

- Alex? Chegou cedo, hoje, então.

Selton fez cara de espanto.

- Que horas você acha que é, meu lindo?

- Umas nove.

- São quase onze da manhã, Rafa.

Rafael arregalou os olhos, alarmado.

- Tudo isso?! Por que você não me chamou.

Selton deu um sorriso doce.

- Estava tão bom ver você dormir que nem percebi a hora passar.

- Olha, eu nunca pensei que você fosse ser tão bobo.

- Foi você que me deixou assim – Selton se defendeu, admirando Rafael.

- Vamos lá? – Rafael disse, dando um pulo da cama.

Rafael e Selton, antes de descerem, arrumaram um colchonete no chão e cobriram com alguns lençóis, depois, namoram alguns minutinhos ali, sob o pretexto de bagunçarem para parecer que alguém tinha dormido ali a noite inteiro, para o caso de Alex ou Sueli olharem e não desconfiarem que, na verdade, dormiram a noite inteira abraçados.

Só então desceram para o primeiro andar, ainda de mãos dadas. Quando viraram o corredor, onde alguém poderia vê-los, se soltaram.

Da cozinha vinha o já o familiar ruído de água fervente, colher mexendo e cheiro de alho refogando. Indícios de que Alex estava no fogão, preparando o almoço, vestido apenas com uma bermuda estampada.

Logo o irmão chegou à cozinha, Alex soltou:

- Você dorme, hein! – e quando tirou os olhos da bacia de alface que lavava na pia, se surpreendeu ao ver Selton.

- Ficamos acordados até tarde.

- E aí, beleza? – Alex cumprimentou Selton, com frieza.

- Selton, esse é meu irmão, Alex.

- Tranqüilo? – Selton estendeu a mão e Alex se apressou em secar as mãos na bermuda.

- Prazer.

- O Selton mora aqui na frente – Rafael explicou – E estamos na mesma turma.

- Entendi – Alex disse, voltando a lavar as folhas de alface

- A mãe não chegou ainda, não? – Rafael perguntou, pegando dois copos no armário.

- Não. Ela foi na casa da Lúcia e ficou presa lá por causa da chuva. Ela deve chegar daqui a pouco.

Rafael serviu os copos com suco de uva que ele tirou da geladeira e entregou um à Selton, sentado na bancada da cozinha.

- Te falei que ela tinha ficado presa em algum lugar – Selton disse.

- E você? Não tinha ido num churrasco ou coisa assim?

- Aham! Nós fomos. Chegamos aqui e a chuva caiu. Eu não ia deixar o Selton sair naquele temporal – Rafael e Selton trocaram um olhar, segurando o sorriso de alegria, lembrando-se do que fizeram na noite anterior.

- Saquei – Alex respondeu, distraidamente - O Selton vai ficar pra almoçar com a gente?

- Não, sei. Você quer? – Rafael perguntou.

- Nada. Vou pra casa. Meus pais já devem estar preocupados.

- Deixa de história, cara. Almoça aí – Alex insistiu, sério.

Ele trocou um olhar de indagação com Rafael, que dizia, sem palavras, para que ele ficasse.

- Ok – Selton disse – Se não for muito incômodo.

- Não é, não – Rafael disse – Alex, quando o almoço estiver pronto, você chama a gente? Vamos lá pra cima ver uns vídeos.

- Vai lá. Daqui a pouco eu chamo vocês.

Os dois saíram da cozinha, sem perceber o olhar suspeito e preocupado de Alex.

Nenhum comentário:

Postar um comentário