sexta-feira, 18 de junho de 2010

Vinte e Oito – Amigos

No decorrer do dia, Rafael ficou ainda mais nervoso, porque Débora não parava de dar em cima de Selton. Toda hora ela o chamava baixinho e falava alguma coisa, jogando seu charme feminino, que não era pouco. Talvez isso não o irritasse tanto, se Selton não estivesse dando corda, retribuindo os olhares e os risos, continuando a conversa.

Afinal, ele seria louco se não desse atenção para Débora. Qualquer garoto normal daria a mão direita para ter uma chance com uma das garotas mais bonitas (pra não dizer gostosas) da escola. Só ele mesmo para não querer nada com Débora. “Droga!”.

Quando o sinal do intervalo tocou, ele saiu quase correndo da sala. Nem soube direito para onde foi, apenas saiu andando, desviando das pessoas que eventualmente apareciam no seu caminho. Quando percebeu estava com a mão na carteira, tirando dinheiro para pagar um pacote de Ruffles de churrasco. “Pra que pedi isso?”, pensou com o pacote na mão. “Nem estou com fome!”. Abriu o pacote foi comendo as batatas sem ânimo algum.

Ficou remoendo aquele sentimento de perda enquanto terminava as batatas, lambuzando os dedos com aquele óleo estranho. Para sua satisfação, ninguém parecia notá-lo,ali, encostado numa pilastra do pátio, ignorando a barulheira de dezenas de adolescentes falando ao mesmo tempo.

- Ei, cara!

Rafael se sobressaltou. Era Selton que tinha aparecido.

- E aí – ele respondeu, amuado – Aceita?

Selton enfiou a mão no pacote e tirou um punhado de batatas.

- Valeu, Rafa. – e antes de comer disse – A Ana estava procurando por você.

- Depois eu falo com ela.

Selton engoliu as batatas crocantes e disse:

- Que houve, cara? Você está desanimado.

Rafael olhou impressionado para Selton. “Ele notou?! Ele me notou?!” E por um instante o frio que se instaurara nele esquentou.

- Ah! – resmungou – não é nada.

- Sério, cara. Pode falar. Eu sei que a gente não se conhece há muito tempo, mas pode confiar em mim.

- Não é nada, Selton. Valeu pela força.

- Ok, Rafa. Mas se precisar, pode contar comigo.

- Obrigado – ele estendeu o pacote de Ruffles, oferecendo mais para o amigo.

Os dois ficaram em silêncio, olhando a algazarra do pátio. Rafael lembrou-se do seu ensino fundamental, em que criancinhas ficavam correndo de um lado para o outro, meninas gritavam e meninos se esborrachavam no chão. As coisas mudaram muito desde aqueles tempos. Embora parecessem mais civilizadas, era curioso perceber que eram ainda, ou até mais, barulhentas.

- Cara, o que você acha da Débora? – Selton perguntou, de repente.

- O quê?! – no susto, Rafael até procurou pela garota ao redor, tentando entender de onde o nome dela surgiu, mas não a achou – Como assim?

Selton não olhava diretamente para Rafael, contemplava a massa de adolescentes que se misturava desordenadamente.

- Éh! O que você acha dela?...

Rafael engoliu em seco.

- Não... não sei... – gaguejou – ela é... – “você não vai querer ouviu o que eu acho dela” - ... inteligente.

Selton tirou os olhos da multidão e encarou Rafael, rindo.

- “Inteligente”?

“Meu Deus! Droga! ‘Inteligente’ seu burro! Qual é o garoto que vai achar a Débora ‘inteligente’?! O que ele vai pensar, agora?!”

- Bonita! – Rafael tentou consertar a tempo a besteira que tinha falado – Ela tem um corpão!

O sorriso de Selton se abriu ainda mais. E Rafael sabia que o amigo estava rindo dele.

- “Corpão” – e riu – Desculpa, Rafa. Mas essa palavra não soa muito bem, vinda de você.

- Foi você que perguntou.

- Eu sei, Rafa. É que você ficou todo vermelho falando dela. Só achei engraçado.

- Hum – Rafael murmurou, não muito satisfeito em passar papel de bobo – Sei. Mas por que você perguntou da Débora.

- Sei lá... porque a achei “inteligente”.

Rafael até se esquecia de ficar bravo, quando olhava para o sorriso sincero de Selton.

- Sério, agora. Ache ela interessante, bonita, legal.

- Você está afim dela? – Rafael perguntou, com o coração apertado, com medo daquela resposta.

- Não sei. Acabamos de nos conhecer, eu não sei nada da garota. Por isso estou perguntando pra você, que já a conhece há mais tempo.

- Eu não a conheço tão bem assim, não. A Ana é mais amiga dela do que eu – Rafael disse, finalizando sua Ruffles, odiando o rumo daquela conversa.

- Entendi. Só perguntei por perguntar mesmo. Não sei se estou afim de ficar com alguém no momento, com toda essa confusão de mudança e tudo o mais.

- Entendo. Aqui cara, vou pra sala que o sinal deve estar quase batendo.

- Vamos lá.

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